domingo, 21 de novembro de 2010

Com ou sem anel ?

Essa polêmica ainda ainda não foi finalizada. Não presencio mais, como há alguns anos, aquelas discussões calorosas em congressos que beiravam o fanatismo. Porém não significa que a questão foi resolvida. Persistem as opiniões apaixonadas de ambos os lados, entre os defensores fervorosos da colocação do anel versus os inimigos públicos número um deste artifício. 
O pivo desta história é um segmento de 6,5 cm de um material sintético a base de um elastâmero que mescla as propriedades inertes e flexíveis do silicone com certa distensibilidade do elástico. Comercialmente tem o nome de Silastic (lê-se "sailastic"). Tem sido colocado desde os anos 70, nas primeira técnicas de gastroplastia com anel, sem secção gástrica e sem a emenda intestinal (Y de Roux). Depois foi utilizado pelo Dr. MAL Fobi em 1989 e pelo Dr. Rafael Capella, ambos nos EUA, em cirurgias similares. Pouco tempo depois, Dr. Capella optou por trocá-lo por uma pequena faixa de tela de um polímero plástico (polipropileno), mantendo a idéia do anel, porém mais curto, com 5,5 cm. Essa medida não pode ser utilizada no anel pois leva à estenose (estreitamento) e à migração (o anel "corroe" a parede do novo reservatório gástrico e entra nele).
A justificativa principal para usar este dispositivo é promover um estreitamento previsível e duradouro, visto que o material é inerte e dura, em princípio, toda a vida, sem a necessidade de substituições ou ajustes. Assim, independente do comprimento do novo estômago, da largura de sua base ou fundo e da anastomose (costura entre o novo estômago e a alça intestinal), a passagem terá um estreitamento por volta de 1,2cm, que é a medida obtida ao fechar o segmento de 6,5 cm de anel ao redor do estômago grampeado. Criticam os cirurgiões que não utilizam o anel dizendo que manter um estreitamento sem material sintético inerte pode levar à dilatação com o passar dos anos, com consequente perda da restrição alimentar, da sensação de saciedade e da estabilidade do peso perdido. Dr. Fobi publicou artigos científicos mostrando pacientes operados com mais de 20 anos, com anel, com excelentes resultados.
Dr. Arthur Garrido, ao trazer a técnica ao Brasil, o fez através de seu aprendizado com seu amigo Dr. Capella, colombiano e muito simpático à causa latina. Formou a primeira geração de cirurgiões bariátricos do país, na qual me incluo como um de seus primeiros alunos. Passamos também a ensinar a cirurgia a outros colegas. Em pouco tempo a técnica de Capella com anel virou sinônimo de cirurgia da obesidade no Brasil, modelo de bons resultados. Parecia até que era verdade no mundo todo. Só parecia.
Os americanos continuaram a fazer uma técnica similar, sem colocar anel nem faixa de tela. E também publicavam bons resultados, criticando a colocação do anel que levaria à maiores dificuldades alimentares e complicações relacionadas, como migrações, võmitos persistentes e deslizamentos com necessidade de reintervenção cirúrgica. Esta linha de pensamento ganhou força a partir de 2001 após a descoberta da grelina, o hormônio da fome, o que voltou as atenções dos pesquisadores à fisiologia hormonal do aparelho digestório, com a identificação de outros hormônio e no entendimento de diversos mecanismos de saciedade. O fator "mecânico" da restrição perdeu espaço para a modificação "química" induzida pela cirurgia. Ninguém mais se sentia confortável em discutir o anel.
De modo definitivo não temos a resposta. Existem verdades dos dois lados. Não temos um estudo randomizado duplo-cego (tem esse nome porque nem o paciente e nem o cirurgião que analiza os resultados sabem quem colocou o anel ou não, o que é decidico por sorteio),  multicêntrico (realizado em diversos serviços cirúrgicos) que esclareça essa questão de uma vez por todas, nem está em vias de acontecer, até onde sei.
Em minha prática diária procuro agir com racionalidade, tentando não me contaminar com as emoções. Já temos mais de 3200 pacientes operados, já fizemos diversas técnicas, com e sem anel, abertas e laparoscópicas. Não demoro muito mais nem muito menos, nem ganho mais nem menos em colocar o anel. Respeito a opinião de meus pacientes, mas para ser sincero, na maioria da vezes eles mesmo me perguntam o que penso, pedindo que eu decida sob a luz da experiência.
Eu continuo a colocá-lo, com exceção nos pacientes acima de 60 anos, em alguns casos de uma necessidade menor de perda de peso (como nas cirurgias metabólicas) e caso o paciente solicite. O índice de complicações relacionadas ao anel está em 1 a cada 200 operados, o que relativamente baixo. E algumas vezes pode ser resolvido por endoscopia. Raramente tenho estenoses e o problema do deslizamento foi quase totalmente resolvido em novembro de 2005. A partir dessa data, passamos a fixá-lo em dois outros pontos mais, sendo que até o momento que escrevo este artigo, não houve mais nenhum deslizamento.
Mantenho a mente aberta, em contínuo aprendizado. Mudarei de opinião sem ressentimentos caso descubra que posso fazer ainda melhor do que fazemos e deixarei de colocá-lo se for o caso. Como disse Raul Seixas, "eu prefiro ser uma metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo...".
Dr. Irineu Rasera Jr.
CRM 75.351

CIRURGIA METABÓLICA

Controle do Peso e do Diabetes
Artigo publicado na Revista Trifatto nº14 jun/jul 2009, Editora AS3, www.trifatto.com.br 
O que a Cirurgia Bariátrica e a Cirurgia do Diabetes têm em comum? Tudo. Diante do controle de quase a totalidade dos diabéticos tipo 2 (DM2) obesos submetidos à gastroplastia, um fato saltou aos olhos. Antes de uma baixa de peso significativa, a glicemia se normalizava. Isto levou os cientistas a investigarem, e descobrirem, que fatores hormonais produzidos no sistema digestivo participavam de maneira decisiva no controle do metabolismo da glicose. E que as alterações induzidas pelas cirurgias de controle do peso, além de diminuição do apetite e aumento da saciedade, propiciavam uma normalização rápida da glicose sanguínea. Em se tratando de doença crônica, cheia de complicações e de forte impacto social como é o diabetes, qualquer luz que traga esperanças de bons resultados é vista com toda a atenção.
De consenso, portadores de DM2 com qualquer grau de obesidade podem ser candidatos a um tratamento cirúrgico. Primeiro se avalia a capacidade do pâncreas em responder ao estímulo pós-operatório, através de exames relativamente simples. Depois, preparo multidisciplinar aos moldes da rotina bariátrica. Tudo obviamente sob os cuidados atentos do endocrinologista. Não há mais espaço para individualidades profissionais.A “Derivação Gástrica em Y de Roux” (DRYR) por laparoscopia é o procedimento de escolha. A capacidade do estômago é reduzida de maneira que se possa comer bem, mas chegando à saciedade com menor volume. A fome também diminui pois, comprovadamente, a Grelina – o “hormônio da fome” - diminui acentuadamente. Os alimentos passam deste novo estômago a uma alça intestinal, onde o processo digestivo continua e onde ocorre outra estimulação hormonal, a grande responsável pela normalização do DM2 juntamente com a exclusão duodenal do trânsito alimentar. Anestesia geral e 3 dias de internação hospitalar são necessários.
Existem outras cirurgias para controle glicêmico, algumas ainda sem consenso ou em fase de estudos: o “Sleeve” Gástrico (ou Manga Gástrica), a “Duodenal Switch”, a Derivação Biliopancreática (Scopinaro) e até mesmo a Banda Gástrica Ajustável Laparoscópica. A DGYR ainda é a mais realizada no mundo.
E para os diabéticos tipo 2 não-obesos? A comunidade cientifica também estuda operá-los através de diferentes procedimentos: a Derivação Duodenal (Cirurgia de Rubino) e o Freio Neuroendócrino (ou Transposição Ileal). Possivelmente a própria DGYR e o “Sleeve” venham a ser considerados. A glicose se normaliza rapidamente mesmo naqueles que tomam insulina, sem baixar muito o peso. Discute-se porém a consistência desta recuperação, a análise do índice risco-benefício e do impacto sobre o risco cardiovascular, objetivo final do controle do diabetes. Pouco adiantaria ter glicose normal, caso a incidência de infarto não diminuísse. Minha opinião pessoal é que estamos próximos de refinar as indicações cirúrgicas nesta população, cuja dependência está nos esclarecimentos definitivos da fisiologia hormonal intestinal.
A medicina como um todo é guiada pelas evidências. Todas as decisões de operar ou tratar clinicamente estão descritas na literatura médica mundial, resultado de pesquisas internacionais, quase sempre repetidas em centros diferentes a fim de serem adequadamente testadas. Nesse modelo já se encontram os tratamentos da obesidade e do DM2 em obesos. Não é pertinente se posicionar contra ou a favor, é uma evidência. Agora, quando se trabalha na fronteira da medicina, como é o caso de operar DM2 não-obesos, mais que em qualquer outro momento, manter o bom-senso é essencial. Atuar dentro de protocolos oficiais de estudos, desnudos de preconceitos e opiniões radicais é saudável e ético.
O mesmo se discute sobre a obesidade leve ou moderada e que ainda não causou uma doença pelo excesso de gordura corporal, mas que incomoda e tolhe a qualidade de vida de pacientes que, por questões profissionais ou sociais, são diretamente afetados por ela. Cito exemplos de mulheres com obesidade leve, na faixa dos 40 anos, originárias de famílias obesas. Ou adolescentes obesas moderadas, sem DM2 ou hipertensão, mas que desde sempre tiveram gordura corporal aumentada. Qual a possibilidade de obterem resultados duradouros com medicações? Muito baixa. Qual medicamento usar? Novos, não há. A depressão, a baixa estima, a exclusão social são comorbidezes psicológicas. Quem dirá não? É um ponto delicado e não se pode banalizar as cirurgias de controle do peso, mas também não se pode negar as dificuldades de se perder o excesso de peso com os tratamento não-cirúrgicos. Levar uma vida de combate ao sedentarismo, ter limites no consumo de gorduras e carboidratos, controlar a ingestão de bebidas alcoólicas e refrigerantes talvez encontrem força e disposição no rearranjo hormonal ou após os cuidados nutricionais e psicológicos que são usados aos portadores da obesidade avançada. Por que não usá-los de maneira racional a quem necessita? Em diversos países se discute a realização de procedimentos mais simples e de baixa morbidade, como a colocação da Banda Gástrica Ajustável Laparoscópica nestas situações. Uma esperança, até termos medicamentos mais eficazes.
Dr. Irineu Rasera Jr.
CRM 75.351

Cirurgia por Orifícios Naturais (ou sem incisões)

Cirurgia por Orifícios Naturais (ou sem incisões)
Artigo publicado na Revista Trifatto nº14 jun/jul 2009, Editora AS3, www.trifatto.com.br 

 
Falando em fronteiras, o desafio da nova era é o NOTES (do inglês “Natural Orificies Transluminal Endoscopic Surgery” ou “Scarless Surgery”). A idéia é aproveitar acessos já existentes à cavidade abdominal a fim de realizar procedimentos sem causar maiores danos ou incisões. A questão estética é importante para determinadas pacientes ou profissionais, mas não é essencialmente isso que está em jogo. Trata-se de propiciar procedimentos cada vez menos invasivos e recuperações mais rápidas e menos dolorosas. Já é possível retirar vesículas biliares e apêndices cecais pela vagina ou até mesmo pela boca, através do estômago, com aparelhos especiais. Mais até: biópsias hepáticas, cirurgias dos rins e ginecológicas e, não tardará, algumas cirurgias para controle do peso caminham para essa via. Temos ainda a limitação tecnológica, os materiais ainda não estão bem desenvolvidos, o que não nos permite realizá-las com segurança em nossa prática diária. Mas a fase de treinamento já deu um gostinho – é fascinante. Uma tecnologia intermediária que está chegando parece interessante. É o “Single Port”, cujo objetivo é operar apenas com a incisão umbilical.
Bom, a ordem é viver bem. Ganhar qualidade de vida ao se curar ou controlar as doenças associadas ou simplesmente se sentir bem consigo mesmo. Tecnologias, sejam bem-vindas. Novas Cirurgias da Obesidade, Cirurgia do Diabetes e Cirurgias sem Incisões – é um Tri-fatto na revolução médica científica.

FAQ em Cirurgia do Diabetes

Adotarei o padrão FAQ para discorrer sobre o tema, num mix de conclusões da literatura e de minhas opiniões pessoais.



Por que chamar de cirurgia do Diabetes?
Tudo começou pela observação de que pacientes obesos e diabéticos submetidos à cirurgia para controle do peso, voltavam para níveis normais de glicose sanguínea antes mesmo de baixar de maneira significativa seu peso.  Paralelamente as descobertas e conclusões sobre a sinalização hormonal do aparelho digestivo explicavam, pelo menos em grande parte, como isso acontecia. Por fim, com a experiência acumulada com as centenas de milhares de cirurgias bariátricas em todos esse anos, pode-se pensar em extrapolar o método para diabéticos não obesos, ou pouco obesos. Em 2006 Dr. Francesco Rubino publicou estudos experimentais de uma nova técnica cirúrgica, a Derivação Duodenal, marcando o início do que hoje chamamos de cirurgia do Diabetes. Também se utiliza o termo Cirurgia Metabólica, pois outras doenças graves do metabolismo, como as dislipidemias podem ser indicações ou se beneficiar destes procedimentos. Recentemente o Dr Eric DeMaria ousou com o termo “cirurgia da hipertensão“, quase uma brincadeira ou um exagero na nomenclatura, mas que expressa a convicção dos pesquisadores nos resultados encontrados até agora.

Qual a diferença para as cirurgias Bariátricas?
As cirurgias do Diabetes (DM2) e as Bariátricas tem muito em comum. O objetivo final em ganhar em qualidade de vida (QdV) é o principal ponto. Mas existem diferenças tanto nas indicações, quanto nos procedimentos. As Bariátricas sempre buscam a perda sustentada de peso e no caso da cirurgia do DM2, o controle sustentado da glicemia, de preferência sem medicações.

Qual a diferença básica do DM tipos 1 e 2?
O DM tipo 1 é decorrente de uma destruição das células Beta pancreáticas, produtoras de insulina, gerando glicemias elevadas por falta de insulina no organismo, que é o carregador da glicose do sangue para dentro das células. Já o tipo 2 acontece em decorrência de uma resistência à ação da insulina nas células, quase sempre em adultos que ganham peso ou que acumulam gordura no abdome, independetemente do peso total. O pâncreas passa a produzir cada vez mais insulina, numa tentativa de compensar essa resistência.

Quais os exames iniciais para se diagnosticar o DM?
Fazer uma glicemia após jejum de 8 horas. O normal é estar abaixo de 100. Entre 100 e 125 pode se chamar de pré-DM ou Intolerância à glicose. Acima de 125 temos o diagnóstico provisório de DM.
Uma glicemia de 200 na curva glicêmica ou na presença dos sintomas clássicos de fome/sede/diurese exageradas confirmam o diagnóstico. A história clínica e a dosagem de anti-corpos diferencia os tipos 1 e 2.

Por que o DM 2 é uma doença tão preocupante?
Em virtude de sua alta prevalência, ou seja, da alta porcentagem da população portadora da doença. Afeta orgãos-alvo no organismo como rins, retina, coração e a inervação. Piora a QdV em virtude da grande necessidade de assistência de saúde e do consumo de muitos medicamentos por toda a vida. Aumenta os gastos com saúde pela assistência pública e privada e diminui a expectativa de vida, principalmente em decorrência de complicações cardio-vasculares.  Nos EUA existem hoje 21 milhões de DM2 e 40 milhões de pré-DM2, responsáveis por 1 a cada US$ 5 do que é gasto com saúde. E 67% deles não alcançam o controle clínico (Hemoglobina glicosilada menor que 6,5%) preconizado pela Associação Americana de Endocrinologia.

Quais são os mecanismos envolvidos na remissão ou controle do DM2?
O primeiro mecanismo é a perda de peso, que já era conhecido há muito tempo, diminuindo a resistência à insulina e podendo levar à remissão do DM. Em alguns procedimentos cirúrgicos, como a Banda Gástrica Ajustável, esse é o único fator atuante. Quer dizer que se perder peso com dietas ou exercício o DM pode se controlar sem cirurgia? Exato, mas o problema é justamente perder peso de maneira significativa, equivalente a uns 10% de seu peso e não engordar novamente, pois acarretaria volta do DM2. Para complicar, alguns tratamentos que controlam rigorosamente a glicemia com determinados medicamentos, infelizmente, podem gerar ganho de peso em longo prazo.
O segundo mecanismo é a mudança na sinalização hormonal do eixo intestino-pâncreas-cérebro. Nossa alimentação segue o trajeto estômago-duodeno-intestino e em cada parte deste caminho estimula a liberação de substâncias pelo aparelho digestivo que atuarão à distância (hormônios), em outros órgãos, avisando em que em que parte do tubo disgestivo se encontram, qual o tipo e a quantidade de alimento (carboidratos, gorduras, proteínas), mantendo o estímulo da fome ou gerando saciedade, e preparando o organismo para armazenar as provisões para os períodos sem alimentação (de horas a dias). A insulina, como já disse, tem papel importante, pois sem ela a glicose absorvida após a digestão dos alimentos, se acumularia no sangue e não entraria nas células para executar sua função básica de combustível para gerar energia. Também lembro que no DM2 os níveis de insulina estão altos, pela resistência à sua ação gerada pela obesidade. Assim, algumas cirurgias mudam a sinalização, diminuindo o tamanho do reservatório gastrico, não permitindo que o alimento passe pelo duodeno ou fazendo com que o alimento chegue a porções mais à frente do intestino, pulando o trajeto inicial. Ocorre a liberação antecipada de hormônios que geram saciedade e que estimulam a produção e ação da insulina nos tecidos periféricos, melhorando ou normalizando a glicemia.


Quais são as técnicas cirúrgicas utilizadas?
1. Derivação Gástrica em Y de Roux, com ou sem anel de contenção (DGYR);*
2. Banda Gástrica Ajustável Laparoscópica (BGA);*
3. Derivação Biliopancreática, Scopinaro (DBP);*
4. Derivação Biliopancreática com Switch Duodenal (DS);*
5. Gastrectomia em manga, Sleeve (SG);*§
6. Derivação Duodeno-Jejunal, Rubino (DDJ);**¨
7. Interposição Ileal com gastrectomia sleeve (I I/SG).**¨

 *  para controle do peso e do DM2
** exclusivamente para controle do DM2
¨  somente dentro de protocolos de pesquisa
§  aprovada no Brasil

Como são os resultados?
São encorajadores, principalmente com a DGYR, com índice de remissão e/ou melhora em torno de 90%, baixa recidiva e baixo índice de complicações. (veja tabela completa no site http://www.bariatrica.com.br/ )
Ainda existem dúvidas sobre essas cirurgias para o DM2? Qual a preocupação dos clínicos, endocrinologistas e cardiologistas em indicá-las?
Sim, ainda existem dúvidas e a preocupação dos clínicos é salutar. O diabetes é uma doença complexa, crônica, de difícil controle e que pode voltar (recidivar) depois de muitos anos. Esse é o principal motivo para evitarmos dizer a palavra “cura“; usamos remissão, ou seja, período livre da doença. Ainda é muito cedo para falar em cura. Não sabemos se após muitos anos da cirurgia a doença não voltará. Isso é particularmente visível nos casos que recuperam peso de maneira significativa. Mas o que parece é que os resultados, embora não sejam  perfeitos, são os melhores que temos disponíveis na atualidade, com relação risco/benefício bastante favorável. E ganhar anos livre da doença pode ser benéfico.
Existe algum fator de predição sobre o resultado para um paciente?
O fator mais relevante parece ser o tempo de diabetes. Pacientes com mais de 10 anos de doença já podem apresentar exaustão das células Beta pancreáticas e não responder bem ao tratamento cirúrgico. Mas isso não é uma regra, é apenas uma observação e pode-se avaliar laboratorialmente a reserva pancreática antes da cirurgia.  Um parâmetro indireto é o tratamento que faz previamente, ou seja, aqueles que usam apenas medicações orais tem maior chance de remissão total do que aqueles que já necessitam tomar insulina diariamente para manter a glicemia controlada. Esse fato nos levar a cogitar que quanto mais cedo intervir, melhores serão os resultados, mas ainda não temos consenso nesse aspecto.

Dr. Irineu Rasera Jr
CRM 75.351

Cirurgia do diabetes


Acabo de retornar da décima - segunda participação consecutiva do congresso americano de cirurgia bariátrica e metabólica, evento anual e que reúne mais de 2000 participantes do mundo todo. Mais uma vez a cirurgia do diabetes tipo 2 (DM2) foi o tema que mais despertou atenção. A doença atinge milhões de indivíduos em todos os continentes e sua incidência continua crescente. Não é para menos, está ligada à obesidade. Mais especificamente ao depósito de gordura abdominal, muito frequente na idade adulta.
Em resumo, está mantida a indicação para cirurgia nos portadores de DM2 e obesidade moderada ou grave, como já prevê as orientações das portarias ministeriais e do Conselho Federal de Medicina sobre as bariátricas. As técnicas mais utilizadas são as gastroplastia, ou derivações gástricas, e os resultados são muito consistentes: acima de 90% de remissão ou controle do diabetes, quando operado antes da função pancreática se exaurir. Esta avaliação é feita com um exame de sangue. O mais impressionante é a velocidade de controle glicêmico. No primeiro dia pós-operatório, as doses de insulina e hipoglicemiantes orais são reduzidas em dois terços.
Quanto aos diabéticos levemente obesos, a resposta à cirurgia também tem se mostrado muito positiva, a ponto de já ser rotina em diversos serviços com protocolos registrados. Podem-se utilizar as mesmas técnicas bariátricas, com pequenas variações que permitem a readequação hormonal do organismo, favorecendo o controle da glicemia sem utilizar medicações na maior parte dos casos e sem causar emagrecimento excessivo.
As novas técnicas cirúrgicas, desenhadas especificamente para tratamento cirúrgico do DM2 permanecem em caráter experimental ou observacional. A derivação duodenal de Rubino e a interposição ileal de DePaula, que famosa pelo apresentador dominical global, ainda carecem de chancela legal para sua realização. Da mesma maneira, as cirurgias para diabéticos magros aguardam parecer favorável das sociedades de especialidades e dos órgãos oficiais, embora as pesquisas já mostrem segurança e efetividade.
Boas notícias para quem depende diariamente do consumo de drágeas, picadas de insulina e testes de ponta de dedo. A cirurgia tem sido uma opção promissora até a chegada de drogas com maior eficácia contra o DM2.
Dr. Irineu Rasera Jr
CRM 75.351